terça-feira, 14 de julho de 2009
Você não vale nada mas eu gosto de você
domingo, 21 de junho de 2009
Liberdade das más razões
Magistrados e advogados abusaram do uso da expressão que sabem ser falaciosa, para chegar à extinção, pelo Supremo Tribunal Federal, da exigência de diploma específico para profissionais do jornalismo. A exigência, não nascida dos motivos repetidos no STF, foi um excesso problemático desde sua criação em 1969, mas nem por isso deixou de produzir um efeito muito saudável e nunca citado, no STF ou fora. Em lugar do diploma específico, a obrigatoriedade de algum curso universitário, não importa qual, seguida de um curso intensivo de introdução aos princípios e técnicas do jornalismo, seria a fórmula mais promissora para a melhor qualidade dos meios de comunicação.
É um argumento rústico a afirmação de que diploma obrigatório de jornalismo desrespeita a Constituição, por restringir o direito à liberdade de expressão. É falsa essa ideia de que o jornalismo profissional seja o repositório da liberdade opinativa. São inúmeros os meios de expressão de ideias e opiniões. E, não menos significativo, a muito poucos, nos milhares de jornalistas, é dada a oportunidade de expressar sua opinião, e a pouquíssimos a liberdade incondicional de escolha e tratamento dos seus temas. (A esta peculiaridade sua, a Folha deve a arrancada de jornal sobrevivente para o grande êxito).
A matéria-prima essencial do jornalismo contemporâneo não é a opinião, é a notícia. Ou seja, a informação apresentada com técnicas jornalísticas e, ainda que a objetividade absoluta seja um problema permanente, sem interferências de expressão conceitual do jornalista. A grande massa da produção dos jornalistas profissionais não se inclui, nem remotamente, no direito à liberdade de expressão. Há desvios, claro, mas a interferência de formas opinativas no noticiário serve, em geral, à opinião e a objetivos (econômicos ou políticos) da empresa. Neste caso há, sim, uma prática à liberdade de expressão, no entanto alheia ao jornalismo, aí reduzido a mera aparência de si mesmo.
Os colaboradores, não profissionais de jornalismo, são os grandes praticantes do direito de liberdade de expressão nos meios de comunicação. E nunca precisaram de diploma de jornalista. A extinção da exigência de diploma em nada altera as possibilidades, as condicionantes e as limitações da liberdade de expressão na produção do jornalismo. Altera o que chamam de mercado de trabalho para os níveis iniciais do profissionalismo. Para os níveis mais altos, há muito tempo as empresas adotaram artifícios para dotar suas redações de diplomados em outras carreiras que não o jornalismo. À parte a questão legal, o resultado é muito bom.
Com o diploma, extinto à maneira de um portão derrubado e dane-se o resto, o STF eliminou sem a menor consideração o efeito moralizante, não só para o jornalismo, trazido sem querer pela exigência de curso. Efeito sempre silenciado. Deu-se que os anos de faculdade e seu custo desestimularam a grande afluência dos que procuravam o jornalismo, não para exercê-lo, mas para obter vantagens financeiras, sociais e muitas outras. Tal prática sobreviveu à exigência do curso, porém não mais como componente, digamos, natural do jornalismo brasileiro. É lógico que as empresas afirmem critérios rigorosos para as futuras admissões, mas sem que isso valha como segurança de passar da intenção à certeza.
O julgamento do recurso antidiploma trouxe uma revelação interessante, no conceito que a maioria do Supremo e os advogados da causa mostraram fazer da ditadura. Segundo disseram, já a partir do relatório de Gilmar Mendes, o decreto-lei com a exigência de diploma era um resquício da ditadura criado, em 69, para afastar das redações os intelectuais e outros opositores do regime. Ah, como eram gentis os militares da ditadura. Repeliram a violência e pensaram em uma forma sutil, e legal a seu modo, de silenciar os adversários nos meios de comunicação, um casuísmo constrangido.
Nem que fosse capaz de tanto, a ditadura precisaria adotá-lo. Sua regra era mais simples: a censura e, se mais conveniente, a prisão.
O julgamento no STF dispensou a desejável associação entre direito à liberdade de expressão e, de outra parte, recusa a argumentos inverazes. A boas razões preferiu a demagogia".
sexta-feira, 12 de junho de 2009
TV Brasil sofre com a burocracia do serviço público
Após um ano e cinco meses de vida e alguns empecilhos a emissora tenta atingir os cidadãos
Os tapetes são velhos, os carros ainda estampam o símbolo da TVE e os funcionários mais antigos se confundem com a troca. Não estão acostumados em trabalhar na nova TV Brasil. À entrada há um televisor moderno, de plasma, ligado no novo canal. A secretária, com o crachá da Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (ACERP), assiste ao programa “Sem Censura”, que já era produzido pela antiga TVE do Rio. E, junto com o segurança, fiscaliza o hall de entrada da sede administrativa do recém criado canal público, a TV Brasil.
Em 2008 estreou no país a TV Brasil. Era o início da construção da nova TV pública na terra tupiniquim. Mas após um ano e cinco meses, são poucos os brasileiros que podem assistir o canal. Nem os habitantes da maior metrópole nacional podem ver a emissora, não há canal aberto e analógico para os paulistas, apenas por parabólica ou digital. A audiência é pequena e a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) passa por dificuldades para legitimar-se.
Não há diferença entre os canais públicos antigos e a TV Brasil.
O presidente Luis Inácio Lula da Silva soltou a pólvora e o alarde foi grande sobre a construção de uma TV pública. No entanto, já existiam outros canais públicos. Para o jornalista Alberto Dines, não há diferença entre a TV Brasil e as outras TVs públicas, como a antiga TVE do Rio e a TV Cultura de São Paulo, por exemplo. “O estatuto é o mesmo e ambas são mantidas com dinheiro estatal”, explica.
Segundo Aziz Filho, gerente executivo de jornalismo da TV Brasil, a principal diferença na construção da nova emissora, para as outras tentativas de um canal público é que essa é a primeira tentativa de uma televisão pública com alcance nacional e maior participação da população. A EBC tenta formar uma rede com as emissoras educativas pelo Brasil e, assim, formar uma programação heterogênea e que extrapola o eixo Rio - São Paulo.
No entanto, a maior parte da programação foi idealizada e produzida pela extinta TVE Rio. O jornal noturno, Repórter Brasil, um dos programas de maior audiência do canal, é transmitido simultaneamente de três estúdios, em Brasília, no Rio de Janeiro e em São Paulo. Apesar de o diário reservar parte do tempo para notícias de outras regiões do Brasil, é nítida a predominância do sudeste no noticiário.
Apesar do orçamento de R$ 350 milhões, a EBC não cresceu o esperado.
A redação do programa Observatório da Imprensa recebeu computadores novos, mas só após um ano e três meses do nascimento da TV Brasil. Dines aponta para os notebooks e com um sorriso no rosto, espera a chegada de câmeras e outros aparelhos eletrônicos novos. “Algumas câmeras estão tão velhas que são amarradas com arame, literalmente”, conta o veterano jornalista.
A EBC é uma empresa estatal e deve seguir os procedimentos burocráticos exigidos pela lei. Isso atrasa o andamento do canal, mas é um problema de todo o serviço público, garante José Paulo Cavalcanti Filho, advogado e membro do conselho da TV Brasil. São esses entraves que Orlando Senna, ex-diretor geral da EBC chamou de “gestão engessante”.
- Discordo da forma de gestão adotada pela empresa que, entre outros equívocos, concentra poderes excessivos na Presidência, engessando as instâncias operacionais, que necessitam de autonomia executiva para produzir em série, como em qualquer TV. – Disse em carta aberta. Senna deixou o cargo de diretor geral em junho de 2008, foi substituído por Paulo Rufino.
Desde o nascimento, já foram criados sete novos programas, além de dois telejornais. A presidente Tereza Cruvinel comemora esse avanço no ano de 2008 e acredita em uma perspectiva ainda melhor para o futuro. Para Cruvinel, “Trocar 20 horas de programação não é fácil em qualquer televisão, muito menos no setor público. Para produzir em casa, nós temos dificuldades com o sucateamento dos equipamentos. E para contratar parcerias, com produtoras independentes, tem todo um procedimento burocrático”, disse em entrevista ao portal Comunique-se.
Os fracos índices de audiência da TV Brasil
No Rio de Janeiro, a cidade com maior audiência da TV Brasil, a média diária marcada pelo IBOPE foi de 0,5 pontos. Mesmo com índices baixos, a direção do canal defende a programação, principalmente o jornal noturno Repórter Brasil. Aziz Filho ressalta que a relação da TV pública com a audiência é diferente. “A TV comercial precisa dos números porque valorizam o tempo do canal. A empresa pública tem outra função: a de priorizar a qualidade, a pluralidade e o cidadão, sem se preocupar com números do IBOPE. Mas é claro que a gente quer ser assistido pelo maior número de pessoas”, destaca Filho.
Para o jornalista Alberto Dines, ainda é cedo para avaliar a TV Brasil: “em um ano não se avalia nada”. No entanto, segundo Israel do Vale, ex-gerente de conteúdo, a emissora está sem rumo. “Ano passado (em 2008), em pleno processo de implantação da TV digital no Brasil, apenas 7% do orçamento - até então, de R$ 350 milhões - haviam sido gastos”.
A TV Brasil procura o seu lugar, mas “não vem para tirar o espaço de ninguém” como disse a presidente Tereza Cruvinel. Para o professor da UERJ Antonio Brasil, o canal ainda não é a BBC e completa: “a emissora não conseguiu ser sequer a TV Cultura de São Paulo, que continua sendo o melhor exemplo de televisão pública no Brasil. E, infelizmente, a TV Brasil também não é, pelo menos, a velha e simpática TVE”.
segunda-feira, 8 de junho de 2009
Mudança de Rumo
Último ano do Ensino Médio e está na hora da fatídica escolha: o que fazer da vida. Consultas a guias de profissões, testes vocacionais, conversas com professores, com pais, com amigos; muitos dias, ou meses de reflexão, e pronto, a escolha está feita. E seja o que Deus quiser. Mas não acaba por ai. Agora está na hora de estudar e de conhecer a profissão de verdade. E se você resistiu até a formatura, está pronto para o mercado. Se construiu uma carreira, trabalhou por anos, está consolidado, não tem mais o que escolher, certo? Errado. Seguir uma profissão é fazer uma escolha diária. É reafirmar um desejo. E se o desejo se modificar, muda-se o rumo, repensa-se a carreira e (por que não?) escolhe-se de novo. Uma mudança de profissão após anos de carreira requer muita coragem, mas quem trocou garante: vale a pena!
Recontar a própria história
A paulista Márcia Dias, 28 anos, escolheu um novo rumo para sua carreira. Técnica na área e estudante de engenharia química, ela acreditava que a área fosse estimulante e desafiadora – “via-me como uma alquimista”. No entanto as pressões da indústria, onde atuou por sete anos, a desanimaram e ela optou por largar a carreira e o curso inacabado de engenharia e procurou a graduação em História da Universidade de São Paulo (USP). “Tive muito medo. Deixar engenharia, um curso clássico, é extremamente pesado”. Hoje, já formada, Márcia cursa o mestrado, trabalha com memória empresarial e leciona na rede municipal de ensino de São Paulo. Ela diz que não se arrepende da primeira escolha profissional: “o aprendizado foi valioso até para eu me conhecer melhor”. Quanto à nova opção de carreira, ela garante “Estou mais em paz”.
Mudança depois dos 30
Patrícia Maglio, 35, escolheu o jornalismo porque gostava de escrever, era curiosa e lia muito – “Achei que tinha todas as características de um bom repórter”. Ela cursou a graduação na Universidade Estadual Paulista, em Bauru, e conta que gostou muito do curso, “mas entre o estudo e a prática há uma grande diferença”. Já formada, Patrícia trabalhou oito anos em diversas áreas do jornalismo, no entanto a cobrança e as extensas jornadas de trabalho a desanimaram. Ela conta que teve vontade de ajudar as pessoas de uma forma mais direta e por isso procurou o curso técnico de enfermagem: “Na enfermagem, muitas vezes o reconhecimento não vem do patrão, mas do olhar de gratidão dos pacientes”. Há quase dois anos trabalhando na nova área, Patrícia explica que não teve medo da mudança e que se sente mais realizada com a nova carreira: “Mudei de profissão depois dos 30 anos e se tiver vontade de mudar outra vez aos 50, mudo.”
O mais curioso no caso de Patrícia é que ela escolheu uma nova profissão totalmente diferente da antiga. Apesar de ter características que a levavam ao jornalismo, Patrícia também tinha aptidões para a área biológica. O psicólogo e professor da Universidade Católica de Petrópolis, Antônio Rubens Coelho explica que as pessoas não tem habilidade para apenas uma tarefa : “ Todos nós temos inteligências múltiplas, e por que não usar uma segunda ou terceira ‘colocada’ na nossa hierarquia de aptidões?”
Jogo de cintura
O mineiro Bruno Gomes, 27, também escolheu uma nova carreira bem diferente da antiga. Ele gostava muito de jogos eletrônicos e achou que o curso de Ciência da Computação seria uma boa chance de trabalhar com o que mais o interessava. Durante a graduação Bruno descobriu que o curso era mais voltado para a área acadêmica: “Pensei que eu fosse poder ficar em contato com o que eu mais gostava: jogos. Mas com o tempo eu percebi que o curso não era bem o que eu imaginava”. Apesar de já pensar em desistir durante a graduação, ele completou o curso e trabalhou por cerca de dois anos com informática, mas não na área de jogos eletrônicos. Bruno explica, que com o tempo, percebeu que realmente não gostava da profissão: “Não suportava ficar preso numa sala, na frente de um computador, por mais de oito horas por dia”. Ele resolveu prestar mais uma vez o vestibular, dessa vez para o concorrido curso de medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, onde já havia cursado a primeira graduação. Bruno ingressou no curso em 2008 e hoje está no terceiro período. “Me sinto completamente feliz com o curso que escolhi. Tenho prazer em estudar medicina, (...) me esforço para ser um excelente aluno.” revela. O futuro médico incentiva a mudança profissional para quem não está feliz com a carreira: “Defina uma meta, isso ajuda muito nos momentos de dúvida, principalmente quando você se pergunta ‘É isso mesmo que eu quero?’”.
Coragem para mudar
A escolha profissional deve ser feita com muito cuidado. O psicólogo Antônio Rubens diz que é preciso se levar em consideração não só as aptidões e os interesses da pessoa, como também seu temperamento e personalidade. A paranaense Glisiane Canali, 27, confessa, no entanto, não ter feito grandes reflexões sobre a primeira escolha profissional. Ela queria prestar vestibular para algum curso na área biológica. Como o curso de Medicina era muito concorrido ela optou por Farmácia, já que o pai tinha um comércio no ramo.
Assim como Bruno Gomes, Glisiane já pensava em desistir durante o curso, mas acabou se formando na Universidade Estadual de Londrina e atuou na área por dois anos. Ela trabalhou durante cerca de um ano na farmácia dos pais, mas não gostava.“Eu fiquei me esforçando pra acostumar e tentar gostar, mas não consegui! Foi muito desgastante, eu tentava trabalhar bastante e não parar pra pensar, tinha dores de cabeça todos os dias”. Glisiane não conseguia se animar com a carreira, chegou a fazer terapia e decidiu mudar de profissão. Hoje ela cursa o terceiro ano de psicologia e diz que o mais difícil é dar o primeiro passo: “Você tem vontade de mudar, mas precisa ter coragem pra ir lá e começar!”
No caso de Glisiane, o mais difícil foi aceitar que estava na profissão errada e partir para uma nova empreitada. Antônio Rubens explica que uma escolha errada começa a se manifestar por ‘sintomas’ como insatisfação, sofrimento, frustração e desconforto emocional, aliados a baixa motivação.
Das exatas às estrelas
Para Cristina Rodrigues, 30, a vontade de mudar de profissão só se manifestou quando ela já estava no mercado de trabalho. Cristina cursou Engenharia de Produção Mecânica na USP. Durante a graduação ela não pensava em desistir “Na verdade, até me formar gostei bastante do curso”. Mas depois de cinco anos trabalhando na indústria, Cristina começou a enxergar o mercado como “um ambiente chato e hostil”. Desestimulada, a paulista começou a se interessar por astrologia e terapias alternativas, fez cursos de formação e hoje é astróloga, terapeuta holística e taróloga. Sobre a nova carreira Cristina revela “Estou crescendo aos poucos, mas gosto muito do que faço”. A dica que ela deixa para quem pensa em redirecionar a vida profissional é “investir em cursos e ter uma poupança antes de fazer a virada. Qualquer nova profissão exige investimento financeiro”.
São muitos os motivos que levam alguém a mudar de profissão. Pode ser uma escolha errada que vai se revelar com o tempo, uma mudança no mercado de trabalho ou simplesmente uma mudança de interesses. O psicólogo Antônio Rubens acredita que uma mudança de profissão pode ser reflexo do fim de um ciclo, ele explica “Acredito que as pessoas possam mudar de profissão, de foco, de interesse a partir de descobertas internas, de fechamento de ciclo de competência. A pessoa trabalha por um tempo em certa ocupação, seu ciclo de competência é fechado, e outro se inicia.”
A psicóloga e professora da Universidade Federal Fluminense Catharina Marinho Meirelles, acredita que a vontade de mudar de carreira acompanha as mudanças que o indivíduo sofre ao longo da vida: “O ser humano muda constantemente. Através das vivências, contatos, desafios, frustrações e realizações que passa ao longo da vida ele tem a oportunidade de atribuir novos significados ao mundo que o cerca.”
quinta-feira, 4 de junho de 2009
Função do repórter
É esta a função do repórter: mostrar a nossa realidade para que as pessoas tenham elementos capazes de transformar esta mesma realidade, reagir diante dela, se quiserem. O resto é burocracia, propaganda ou literatice, não tem nada a ver com jornalismo. Complicaram muito as coisas, mas jornalismo é uma arte muito simples: um repórter e um fotógrafo na rua, mentes e corações bem abertos, contando as histórias do dia-a-dia da vida.
domingo, 31 de maio de 2009
Sebastião Salgado
sábado, 25 de abril de 2009
Arte que transforma, filosofia que contrói
O projeto Arte Ação Ambiental, do Museu de Arte Contemporânea de Niterói, atua há nove anos na comunidade do Morro do Palácio. Através de oficinas e programas complementares, os jovens adquirem profissionalização, educação artística e ambiental. O projeto contribui para a geração de renda de algumas famílias, além de possibilitar a formação de cidadãos mais participativos, criativos e responsáveis.
A iniciativa começou a ganhar forma em 1998, após uma visita ao MAC de jovens da comunidade, participantes de uma oficina do projeto Capacitação Solidária. Durante a visita, os questionamentos desses jovens despertaram o interesse do atual coordenador geral do projeto e diretor do museu, Luiz Guilherme Vergara, que, junto com outros profissionais, já tinha uma idéia de projeto, mas sem onde aplicar.
No artigo MAC/Niterói – um museu para a arte e o mundo contemporâneo, da edição de maio de 2006 da Revista Eletrônica Jovem Museologia, Luiz Guilherme definiu o programa. “Arte Ação Ambiental aponta para uma prática transdisciplinar de formar projetos para criação coletiva, cuja culminância é a relação do indivíduo com a sua realidade. O museu passa a ser o mundo, o suporte e os materiais artísticos – a própria existência”.
Assim, em julho de 1999, nasceu o Arte Ação Ambiental, criado a partir da necessidade do museu de expandir sua área de atuação junto a diferentes grupos sociais. O projeto começou atendendo 40 jovens, entre 14 e 24 anos, com quatro oficinas: de jogos neoconcretos (jogos interativos baseados na obra de João Sattamini), papéis reciclados, paisagismo e jardinagem e uma de cidadania, visando à educação ambiental. Além disso, os participantes contavam com reforço escolar. Uma das exigências da iniciativa era que eles continuassem estudando.
Muitos participantes seguiram engajados no projeto, mesmo após o recesso de final de ano das oficinas. O Arte Ação transformara a realidade de alguns deles, a quem caberia o papel de multiplicadores. É o caso de Elielton Rocha, que participou do projeto desde o início e atualmente é professor de uma das oficinas e estagiário da Divisão de Arte Educação do MAC.
Segundo Elielton, no início ainda havia um estranhamento tanto por parte dos moradores da comunidade, que viam o MAC como algo muito diferente da sua realidade, quanto por parte dos professores, orientadores e coordenadores, que também tiveram que se acostumar com dois ambientes tão próximos, mas tão diferentes. “Quando passávamos da porta do museu para cá, estávamos em um lugar desconhecido para nós. Para eles também, quando passavam para comunidade, rompiam uma barreira muito grande.”
O Arte Ação Ambiental começou a ser divulgado através de mobilizações. Os organizadores faziam workshops, levavam as oficinas e seus produtos até a comunidade e os jovens procuravam o que lhes interessava. Essa estratégia serviu como um estímulo para a participação das pessoas. Até mesmo crianças, que não eram o público-alvo das oficinas, por serem profissionalizantes, começaram a se interessar. Para atender esse contingente, os organizadores elaboraram grupos especiais para ensinar técnicas de fabricação de papel a elas.
Atualmente, por falta de infra-estrutura apropriada na comunidade, as oficinas acontecem em outros locais, como no Colégio Estadual Aurelino Leal, no Ingá. Mas com a construção do Módulo de Ações Comunitárias no Morro do Palácio, o Maquinho, o projeto poderá se expandir. O Módulo tem projeto arquitetônico de Oscar Niemeyer e é patrocinado pelo Fundo Social do BNDES. A localização íngreme e de difícil acesso atrasou a conclusão da obra, que será inaugurada em dezembro.
O coordenador executivo do projeto Leandro Baptista explicou que, com a construção do Módulo, o Arte Ação Ambiental se transformará em mais que um projeto, tornando-se uma filosofia de humanização da cultura através de uma maior participação de entidades como o MAC. Os coordenadores do projeto acreditam que, no futuro, a iniciativa poderá se expandir para outras comunidades de Niterói.
A arte como formadora de uma consciência do olhar
Elielton Rocha comentou que entre alguns participantes do projeto havia a vontade de mudar a comunidade. O que esses jovens não percebiam, porém, é que a mudança já havia começado neles. A arte passou a influenciar o olhar de cada um acerca do seu cotidiano, de sua realidade. “A comunidade continuava com os mesmos problemas, mas nós é que estávamos vendo de forma diferente, perdendo um pouco da irresponsabilidade e tendo até um pouco mais de carinho pelas coisas da comunidade.”Através das oficinas e ações educativas, o Arte Ação Ambiental permitiu uma valorização e maior interação dos jovens da comunidade com a cultura local. O projeto levou a arte contemporânea para além dos limites do museu, possibilitando que um grupo excluído do acesso à cultura pudesse freqüentar e interagir com o universo artístico.
domingo, 19 de abril de 2009
Por Luiza Barros
Come you masters of war
You that build the big guns
You that build the death planes
You that build all the bombs
You that hide behind walls
You that hide behind desks
I just want you to know
I can see through your masks
You that never done nothin'
But build to destroy
You play with my world
Like it's your little toy
You put a gun in my hand
And you hide from my eyes
And you turn and run farther
When the fast bullets fly
Masters of War – Bob Dylan
Por que garoto, mal saído da adolescência, com as bochechas rosadas e as roupas largas, resolve passar os que poderiam – e deveriam – ser os melhores anos na da sua vida numa guerra civil em um dos muitos países da África, um daqueles eternamente esquecidos pelo resto do mundo?
Aos 22 anos Dan Eldon foi morto na Somália durante uma turba Somali. Ele cobria o conflito no país, como fotógrafo da agência internacional de notícias Reuters, junto com outros três jornalistas também mortos no mesmo dia: Hos Maina, Anthony Macharia e Hansi Krauss.
A pergunta do primeiro parágrafo é comumente a que as pessoas fazem – mesmo que em silêncio – quando ficam sabendo do triste destino de Dan. Seria difícil dizer, mas ele não foi o único, nem o primeiro, nem o último a fazer tal tipo de escolha.
É claro que existe o espírito de aventura, a necessidade de se arriscar, de fazer a própria vida ser memorável, talvez mais lembrada por alguns do que a dos que vivem no continente dos eternamente esquecidos. Mas Dan, ele poderia ter pulado de bungee jump se quisesse aventura, poderia ter virado um acionista da Wall Street se quisesse riscos, poderia ter participado do Big Brother se quisesse exposição. Mesmo assim, não, mesmo tendo todas as opções que um rapaz com algum dinheiro e alguma beleza poderia ter, ele resolveu ir pra guerra, não para lutar, mas para tirar fotos. Entrada vip para conhecer o inferno.
A partir desse questionamento, a irmã de Dan, Amy Eldon, inicia sua jornada no documentário Morrendo para contar a história. Em seu primeiro filme, Amy reconta a história do irmão com um sentimentalismo que, apesar de sincero, não deixa de ser encenado para as câmeras. Isso pode incomodar alguns, mas mesmo assim não tira o mérito do trabalho. O mais interessante não é, na verdade, a “jornada” de Amy, mas sim os depoimentos dos fotógrafos e jornalistas de guerra que ela encontra em seu caminho. Nomes grandes, como Christiane Amanpour, Martin Bell, Don McCullin e Peter Mugabane, entre outros.
Cada um, com suas trajetórias de vida distintas, tem uma história diferente para contar. E com uma visão diferente do que significa estar lá, no inferno, como observador, testemunhando, fotografando, relatando, enfim, trabalhando, nada mais do que um trabalho, um meio de vida. É a partir daí que cada um se revela; uns vêem isso como prestação de um serviço à sociedade, como algo grandioso, transformador, capaz de mudar o mundo. Estão convictos, seja porque realmente acreditam ou porque precisam acreditar, como um escudo protetor de todos os traumas que a guerra pode trazer. Outros – e aí o maior exemplo é o depoimento comovente de Don McCullin – não se sentem tão inabaláveis assim. As convicções foram todas perdidas, não há nada de heróico, de transformador naquela função de capturar suas impressões da guerra; chega a ser até, de certa maneira, vergonhoso.
Fica mais fácil de entender o pessimismo de McCullin quando o vemos na tela. Um homem arrasado, que olha para baixo ao andar e fala com a voz desconsolada. McCullin conta porque largou o fotojornalismo de guerra. Após 35 anos cobrindo conflitos, sempre seguiu a receita de Robert Capa (considerado o maior dos fotógrafos de guerra) de chegar mais perto da cena até que, um dia, no Beirute, não pôde mais. Uma bomba, mandada pelos israelitas, explodiu em um condomínio. No meio da confusão, uma mulher surgiu, desesperada, histérica (como mais poderia estar?). Don não hesitou e bateu a foto. Seu trabalho. A mulher viu e veio em sua direção, com as lágrimas rolando, e começou a socá-lo. Don agüentou – com apenas um movimento já havia agredido muito mais; conseguira elevar o sofrimento que já estava no auge. Voltou para o hotel, mal agüentando a culpa e vergonha que sentia, quando recebeu o aviso: aquela mulher, aquela que sofreu tanto, tinha acabado de ser morta. Morta.
O documentário termina contando os dias finais de Dan Eldon. Em seus cadernos, Dan misturava relatos diários, citações, desenhos e recortes de suas próprias fotos. Era uma forma de tentar expressar todos os sentimentos misturados que sentia em relação à sua vida e ao que via. E à morte. Em certo ponto, fica claro que as abstrações de Dan não estavam apenas no papel, mas na confusão que se tornara sua mente. Ele planejava um retorno daquela viagem ao inferno quando foi morto. Já tinha tido demais.
12 de Julho de 1993, Mogadishu, capital da Somália. Uma operação do exército americano bombardeou o prédio central da ajuda humanitária. Os americanos, em um erro grotesco de inteligência, acreditavam que se encontrava ali o clã do “senhor da guerra” Mohamed Farrah Aidid. Cinqüenta pessoas foram mortas por isso. A multidão rebelou-se e, no meio da tragédia, os jornalistas da Reuters que vinham em um jipe foram atacados e levados até a morte, pisoteados pela multidão enfurecida.
A história de Dan Eldon acabou ali, quando passou a ser mais uma das tantas vítimas de uma das tantas guerras que já tomaram lugar. Depois disso, muito se foi feito e dito com o nome dele. A família de Dan, talvez numa tentativa de aliviar a sua dor elevando-o ao heroísmo, ou pelo menos, ao não-esquecimento, divulgou os seus diários de todas as formas possíveis. Fundaram uma organização chamada Creative Visions Foundations em sua memória. Amy produziu o seu documentário de que tanto falamos. Uma adaptação para o cinema de sua vida está sendo preparada, até agora com o título de The journey is the destination, uma das frases cunhadas por Dan em seus diários. O astro adolescente Daniel Radcliffe foi escolhido pessoalmente pela mãe do fotógrafo para vivê-lo nas telas.
Apesar de todo esse interesse midiático, de toda essa glorificação, nada é capaz de tirar o gosto amargo sentido nas palavras de Don McCullin. Dan muito provavelmente não desejava ser um herói póstumo, e sim ter uma vida intensa. Ver a realidade da guerra, com todos os seus ossos expostos, é, de fato, uma forma de levar a vida ao extremo. Não faz sentido medir aqui se vale a pena ou não, se todos aqueles retratos e relatos são capazes de mudar algo no mundo ou nas pessoas. No entanto parece, depois de ver toda aquela destruição que vem do alto, dos senhores, como se viesse de lugar nenhum, mas que atinge a todos, a troco de alguma coisa para os senhores, e absolutamente nada para nós, que não existe algo tão impiedoso, tão injustificável, mas mesmo assim, tão recorrente quanto o horror, o horror da guerra.
Resenha – Documentário: Morrendo para contar a história.
Por Luciana Pacheco
No cotidiano de um fotojornalista, um simples clique determina o recorte da realidade que será eternizado. Uma fração de segundo a mais e o momento será perdido. Consciente disso, esse profissional está sempre atento aos menores detalhes do mundo ao seu redor e muitas vezes arrisca a própria vida em busca da foto perfeita (de acordo com a sua concepção de perfeição): geralmente aquela que transmite alto teor de informação, de emoção ou ambos; aquela que fala por si e torna todas as palavras desnecessárias; aquela que vai entrar para a História. Esse instinto de determinação um tanto “suicida”, de quem não tem medo do perigo, é a união de duas fortes paixões: a do fotógrafo e a do jornalista. Combinação excitante e perigosa, que pode levar tanto à glória e ao reconhecimento internacional como à morte.
É o tema tratado no documentário “Morrendo para contar a história” (Dying to tell the story), de 1997, produzido por Amy Eldon. A cineasta conta não haver superado o fato de seu irmão, o fotojornalista Dan Eldon, ter morrido durante a cobertura de uma guerra na Somália em 1993. Na época, Dan tinha 22 anos e trabalhava para a agência de notícias Reuters. Depois da morte do irmão, Amy, com apenas 19 anos, entrou em depressão profunda e largou a faculdade. Não conseguia entender o motivo que levava tantos fotógrafos, assim como Dan, a enfrentar o perigo de uma guerra para conseguir algumas imagens. Amy entrevistou fotógrafos e jornalistas, famosos correspondentes em guerras, a fim de descobrir mais sobre a vida do irmão e sobre o fascínio que pusera fim à sua jornada tão prematuramente.
A paixão pela profissão era comum em todos os depoimentos; o que variava eram os motivos. Alguns consideravam o fotojornalismo uma missão: a de informar a todo custo com a maior objetividade possível; outros exaltavam o impacto emocional da imagem, até certo ponto manipulado pela técnica, e o seu efeito de mobilização social; e outros ainda pareciam apreciar a prática fotográfica por satisfazer o próprio ego. O conteúdo do documentário fornece assuntos não só para muitas resenhas, mas para várias discussões deontológicas relativas à profissão.
Uma questão muito relevante, comentada pelo fotógrafo africano Peter Magubane e que toca a grande maioria dos fotojornalistas é a esperança de que suas fotos poderão mudar o rumo da História. Intimamente associado ao ideal jornalístico de libertação por meio do esclarecimento, esse desejo é manifestado também por Dan Eldon, nas palavras de sua irmã: “O que realmente motivava Dan era o fato de que ele estava fazendo a diferença (...) obrigando as pessoas a agir”.
Sentimento esse que norteou Magubane durante toda sua carreira. Famoso por retratar as imagens do apartheid, na África do Sul, foi duramente perseguido. Chegou a ter sua casa destruída e a viver uma vida de fugitivo. Mas para ele esse era o preço a pagar para divulgar ao mundo a cruel realidade dos negros em seu país. Ele dizia que “uma luta não documentada não é uma luta”. As fotos de Peter Magubane funcionaram como evidências irrefutáveis das injustiças do apartheid, sensibilizaram a sociedade ocidental e foram fatores importantes no auxílio à derrubada do regime oficial de segregação na África.
Nesse sentido, pode-se citar as fotos do holocausto – não comentadas no filme por pertenceram a contexto diverso daquele em que Dan viveu –, que evidenciaram o horror a que os judeus foram submetidos na Alemanha durante a Segunda Guerra. O mundo inteiro sabia da perseguição ao povo judeu, mas o impacto das imagens, amplamente divulgadas após o conflito, causou uma espécie de comoção mundial. Com o objetivo de evitar a repetição de tal barbárie, foram criadas organizações e tratados de promoção e defesa da paz e da igualdade, como a Declaração dos Direitos Humanos; além de centros documentais que guardam as memórias terríveis da guerra, como o Museu do Holocausto. Museus que reúnem fotografias chocantes até mesmo para uma sociedade acostumada à violência, a fim de que o mundo não se esqueça das práticas desumanas que a xenofobia pode estimular.
Enfim, uma das conclusões a que se pode chegar assistindo ao documentário, e que emociona tanto a Amy quanto aos espectadores, consiste no fato de que o valor da fotografia como documento histórico é incontestável, mas talvez, numa sociedade em que a imagem tem o poder do convencimento e a fotografia representa uma prova da verdade, mais relevante ainda seja o seu valor como instrumento capaz de provocar reações e alterar o rumo dos acontecimentos. Esse ideal orientou Dan Eldon e muitos outros que morreram não somente tentando contar a história, mas, principalmente, tentando mudar a história.